Miguel Torga - 12 de Agosto de 1907



Fosse vivo e Miguel Torga (Adolfo Correia da Rocha) teria ontem completado 102 anos. Dos autores portugueses, passados e presentes, nenhum me seduz tanto como este agreste transmontano, de nariz adunco e rosto granítico a condizer com a rudeza do berço onde brotou.

Gerês, 12 de Agosto de 1952

Quarenta e cinco anos. Numa solidão cortada por dois telegramas e dois postais, lá se passou mais este dia fatídico do meu aniversário. E digo fatídico, porque realmente o é todo aquele que assinala o nascimento de um poeta, mormente aqui em Portugal e nos tempos que vão. Desde que me conheço com alguma consciência que sinto isso. E sempre que me ponho a olhar do alto de cada marco do caminho andado, apenas consigo vislumbrar o rasto agonizante de um pobre destino humano, que nem ao menos se refresca  na bica de nenhum verdadeiro devotamento tutelar. Nunca se viu no pó da estrada peregrino tão sedento e desiludido da ternura dos semelhantes! 

Sismógrafo hipersensível, que regista os estremecimentos do mundo e de si próprio, e que um abalo mais brutal desafina, acabei por ficar desirmanado na sala do observatório, absurdo, espectral, a pulsar desalmadamente enquanto a corda se não acaba, sem conseguir ver do passado mais do que a serrilhada angústia de um gráfico incansável, que só meia dúzia de entendidos poderão mais tarde decifrar.

Miguel Torga, DIÁRIO Vols. I a VIII - Publicações D. Quixote.

Com este artigo e uns simples rabiscos feitos à pressa, fica aqui a minha rudimentar homenagem ao escritor e poeta.

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