Laura Costa - Artista plástica e ilustradora


Já em diversas ocasiões temos publicado por aqui no Santa Nostalgia vários conteúdos referenciados à artista plástica e ilustradora Laura Costa, no caso, essencialmente ilustrações provenientes de livros de contos infantis, livros escolares, catecismos, postais, etc. Simultaneamente temos confessado a admiração e gosto pessoal pela obra da artista, desde logo porque vários desses suportes que foram enriquecidos com a sua arte remetem-nos para circunstâncias próprias da infância, como a escola primária, a catequese, os tempos livres e as primeiras leituras de contos de fadas, por isso memórias muito queridas e saudosas.
Apesar disso, pouco ou nada falamos sobre a artista. De resto pouco haveria a falar porque, mesmo sendo conhecida muita da sua vasta obra e do abundante leque de suportes que receberam as suas ilustrações, pouco se sabe, nomeadamente quanto aos aspectos biográficos. Também não é conhecida publicamente qualquer fotografia da artista.

Do que se sabe, e aos poucos vai-se sabendo mais, e em grande parte tal deve-se a pessoas como o conhecido escritor e admirador confesso da obra da artista, Mário Cláudio, bem como do investigador na área de infância Sérgio Costa Araújo, os quais, com o apoio da Câmara Municipal de Paredes de Coura – Minho, promoveram no final de 2017 o evento “Laura Costa – Primeira Exposição Rectrospectiva”, que decorreu no Centro Mário Cláudio, na referida localidade minhota.

Existem ainda algumas notas biográficas sobre a autora, em alguma literatura sobre ilustradores portugueses, como no caso  o "Dicionário de Literatura Infantil Portuguesa", de António Garcia Barreto, Editora Campo das Letras, a páginas 159, mas tudo muito sintomático, pouco mais que uma breve nota de meia dúzia de linhas.


(auto retrato - 1931)


Sabe-se que Laura Olinda Alves Costa nasceu em 1910 na freguesia da Vitória, na cidade do Porto (Faleceu em 1993), sendo filha de António Augusto Alves Costa, nascido em 1873, e de Laura Alves Costa, neta paterna de António Bernardino Alves Costa (1845-1912), um dos fundadores do Ateneu Comercial do Porto, e de Olinda do Espírito Santo.
Fez estudos superiores e formou-se na Escola de Belas-Artes do Porto, entre 1929 e o final da década de 30, com médias quase máximas, tendo tido professores como os pintores Joaquim Lopes e Acácio Lino. Pelo meio, frequentou ainda a  Faculdade de Ciências. Diz-se que terá sido na referida instituição de ensino a primeira aluna a ter acesso aos aulas de desenho de nu, o que antes apenas era reservados aos alunos masculinos.

Ainda na Faculdade de Belas-Artes, fez parte do grupo de artistas designado de “Mais Além”, do qual faziam parte nomes como  Augusto Gomes, Dominguez Alvarez, Guilherme Camarinha, Reis Teixeira e  Ventura Porfírio. O grupo na sua génese “questionava os cânones do ensino académico e naturalista da instituição das Belas-Artes e  já produzia orientações programáticas para  o movimento artístico do modernismo. 

Laura Costa terá sido uma aluna e artista de qualidade reconhecida na altura já que é sabido, por catálogos da época, que ainda apenas com treze anos de idade integrou os trabalhos expostos no Salão de Humoristas da Cidade do Porto. Participou ainda em mostras na Galeria Silva Porto, em 1929 e um pouco mais tarde, em 1931, no Ateneu Comercial, instituição a cuja fundação estará ligago seu avô materno.

Sobre aspectos pessoais pouco ou nada conhecidos, colhi publicamente a informação de que Laura Costa era prima do crítico e historiador de cinema Henrique Alves Costa, também madrinha do arquitecto Alexandre Alves Costa e amiga chegada do já desaparecido centenário cineasta Manoel de Oliveira.

Para além da sua ocupação de artista, sobretudo na área da ilustração infantil, foi professora no Colégio do Rosário, uma instituição ligada à religião católica, na cidade do Porto, apesar de se identificar como não crente. De resto, a ser verdadeira esta sua faceta, não deixa de ser mais significativa a forma vasta e expressiva com que produziu trabalhos com a temática religiosa e católica, de que se destacam catecismos e postais alusivos ao Natal bem como ao contexto de Nossa Senhora de Fátima.

Um pouco a reboque desta sua relação de trabalho com as instituições da Igreja ou do Estado tem sido conotada com o regime do Estado Novo, mas diz quem sabe que tal não corresponde de todo à realidade. Apenas uma relação formal e profissional. Porventura a preferência pelos seus trabalhos prendia-se com o estilo desprendido e linear que de algum modo retratava um certo bucolismo das tradições, costumes e figuras do Portugal muito rural e religioso da época.

Como artista com formação superior, era naturalmente uma pintora, mas esta sua faceta é menos produtiva e quase desconhecida. Ao contrário, a ilustração e sobretudo a de carácter infantil é abundante. Ilustrou livros de contos de fadas, de variados formatos, catecismos, livros, manuais e cadernos escolares, calendários, almanaques, capas diversas e postais, mas também ilustrou para jornais, sobretudo para o já extinto “O Primeiro de Janeiro”, entre 1954 e 1976, com a particularidade da tradição de ilustrar as capas do dia de Natal. 

Laura Costa ilustrou para editoras de prestígio, como a Lello, para vários autores particulares, para empresas várias, como a Oliva e Banco Português do Atlântico, para a Igreja, entidades ou empresas públicas do Estado, como os CTT, etc. Mas de todos quantos recorreram à sua arte e inspiração, destaca-se a Editora Majora, muito ligada ao universo infanto-juvenil, ilustrando muitos livros, nomeadamente os das colecções “Varinha Mágica”, “Princesinha”, “Pinto Calçudo”, "Pintarroxo", "Série Ouro", “Série Prata”, estas em capa dura, e outras mais, mas também ilustrações para os clássicos jogos de madeira e puzzles em cubos.

Como se percebe, a sua obra artística é ampla e espalhada praticamente pelos anos em que viveu, mas a sua produção concentra-se principalmente nas décadas de 40 e 50. Temos, porém, na nossa colecção, livros por ela ilustrados editados ainda nos anos 30.

O estilo ilustrativo de Laura Costa é inconfundível e muito pessoal, embora com características que possam ser associadas a algumas semelhanças com artistas seus contemporâneos, sobretudo com Raquel Roque Gameiro, que também com qualidade muito ilustrou no contexto infanto-juvenil. 
Mesmo não conhecendo a componente plástica das suas pinturas, as ilustrações, porque bem mais divulgadas e públicas, são no geral muito limpas de traço linear e escorreito mas a par de algum detalhe expresso sobretudo na pormenorização do vestuário e cabelos das suas personagens. Mesmo na utilização cromática a técnica é muito simples, sem grandes aventuras fora da paleta da naturalidade.

Em certa medida não custa a acreditar que o seu estilo linear e constante de grande parte das suas ilustrações,  povoadas por figuras dos contos de fadas, com príncipes e princesas, tem muito a ver com os requisitos técnicos dos editores e poupança de custos em muitas das edições, sobretudo de livros para crianças, que se pretendiam baratas e acessíveis. Por isso o traço preto, recorrente e indistinto, reservando-se a cor para as capas ou para edições mais requintadas, para públicos mais exigentes. Esta não foi a regra, é certo, mas terá tido certamente a sua quota de alguma influência. 
Quem vê os primeiros trabalhos ilustrativos dos anos 30, nomeadamente em edições da Lello, ou mesmo trabalhos anteriores, comparando verifica que o seu estilo apesar de fiel à génese de simplicidade, mudou e foi sendo aprimorado, o que de resto é natural na evolução de qualquer artista.

Laura Costa nos últimos anos da sua vida, pela década de 1980 dedicava-se mais à pintura, certamente porque já sem a pressão das encomendas e prazos do trabalho editorial, bem como sempre que podia transmitia os seus saberes em aulas particulares que leccionava na sua própria residência. 
Terá falecido em 1993, por isso com 83 anos de idade.

Esperemos, pois, que com tempo, Laura Costa venha a ser mais reconhecida como artista ímpar no universo artístico português e de modo especial no contexto da ilustração infanto-juvenil e que os ainda muito raros pormenores artísticos e biográficos venham a ser ampliados e melhor divulgados para assim todos aqueles que nutrem admiração e preservam boas e doces memórias ligadas aos objectos enriquecidos pela sua arte, a melhor possam admirar e respeitar. 

Por aqui, sempre que se proporcionar, iremos publicando algumas das suas ilustrações extraídas de muitos dos livros que temos ou partilhando o que publicamente vai sendo publicado.


Comentários

  1. Tenho um jogo de puzzle de cubos da MAJORA com ilustrações de LAURA COSTA.
    Os cubos em madeira, com papel colado, e com 6 desenhos alusivos ao conto da Gata Borralheira.
    Um mimo.

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  2. Acabo de ler a postagem sobre Laura Costa cujas obras me deliciaram quando era menina e moça. Tinha uma maneira muito própria e simples de ilustrar os livros e jogos infantis que deliciavam quem tinha oportunidade de os possuir. Penso que pode dizer-se que Laura Costa coloriu Portugal. Agradeço ter paratilhado o seu saber...

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