Há coisas assim, tristes, que se apoderam de nós de uma forma inexplicável. Compreende-se face a um desaparecimento de alguém próximo, que conhecemos, que gostamos, que amamos. Mas de alguém que só conhecemos pelos caminhos do mundo digital e com quem nunca tivemos contacto pessoal, nem sequer lhe conhecemos o rosto, é mais difícil de explicar, mas seguramente devido a uma corrente muito humana de sentimento e empatia.
Há tempos, através de um blog que comecei por experimentalismo na plataforma Sapo, essencialmente com algumas ilustrações, mas que pouco durou, porque muitas vezes as coisas terminam em desapego tão rapidamente quanto o entusiasmo inicial, alguns dos comentários que ali recebi eram de uma autora de um outro blog na mesma plataforma, onde usava um pseudónimo de Marta mais qualquer coisa, mas Paula C. de nome real.
Através do meu contacto no dito blog, um dia recebi um email em que se mostrava interessada que lhe ilustrasse uma pequena história para um livro infantil que publicaria em edição de autor. Já tinha publicado algumas outras histórias de sua autoria mas queixava-se do elevado preço pago aos ilustradores para além das dificuldades de reconhecimento e divulgação próprias de edições de autores.
Aceitei o desafio e elaborei uma dúzia de ilustrações para o livro, que adorou. Queria pagar mas eu disse-lhe que não pagaria nada. Como contrapartida receberia apenas alguns livros.
Infelizmente, por motivos de doença oncológica com que já se debatia há algum tempo, a publicação acabou por ficar adiada.
Ontem, por um mero acaso, cheguei ao seu blog onde alguém no turbilhão de comentários estranhando a longa ausência, noticiou que falecera, logo a seguir ao último Natal. De resto, também soube agora, que em Agosto publicara algo a dar conta que o seu problema já não tinha cura e estava a aguardar a partida.
Que descanse em paz.
Quanto às ilustração ficam como memória. Quem sabe ainda tentarei o contacto de alguém da família para ver se têm interesse em dar seguimento ao que ela projectara. Enviei um email na esperança de que, como quem manda uma mensagem num garrafa através do mar, alguém com acesso respondesse, mas para já nada, e é bem provável que ninguém, mesmo chegado, tenha acesso ao email e me venha a responder. Por outro lado também não me sinto no direito de usar a sua história e tentar a publicação.
Mas, quem sabe, talvez alguém, nesta longa praia digital, receba a garrafa. Quem sabe...
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