Outono

 

Tão rápido como chegou, o Verão foi-se de mansinho e deu lugar ao senhor Outono, austero e experiente, habituado a colher o que a Primavera brotou e o Verão amadureceu.

Não tardou, pois, que o senhor Outono pusesse mãos à obra e num ápice convocou as gentes do campo para a azáfama das colheitas por campos e soutos, montes e vales. Espigas de milho doiradas e maduras já enchem os cestos e amontoam-se nas velhas eiras; Os pesados cachos de uvas maduras, pintadas a ouro ou a púrpura, já enchem lagares onde brotarão mosto e vinho.

É verdade que as esfolhadas ou desfolhadas, como se diz na minha aldeia, já não reúnem o povo numa roda viva de trabalho, contentamento e cantigas; Já não há xis ao milho-rei e o serandeiro já não aparece discreto com o ramo de alfádega ou rosmaninho e as raparigas já não querem partir as unhas e as suas esfolhadas são outras.

No lagar já não há pernas despidas numa dança de ombros unidos ao som da sanfona ou da concertina. Certamente que num ou noutro local remoto deste nosso Portugal, mas no resto, as máquinas pouparam-nos o esforço mas roubaram-nos a alegria do colher e transformar com as mãos.

O senhor Outono já não é o que era e até ele já parece mais desconsolado, desanimado com a partida que os tempos lhe pregaram. Já nem as suas roupagens de tons quentes nos consegue aquecer a alma ou extasiar o olhar. Ficamos, pois, indolentes, à espera do senhor Inverno, que com mais frequência se atrasa, mas que há-de-chegar, frio e molhado, a remeter-nos, já não à lareira e adormecer no morno das brasas ou ao ritmo de histórias e lendas, mas ao sofá a matar o tempo olhando a televisão até que o sono diga: - Boa-noite!

outono jose_malhoa

- Outono – José Malhoa – Museu do Chiado - Lisboa

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